A propósito do trabalho de uma colega veio à discussão a questão da adequação e facilidade de leitura de imagens, do mesmo objecto, quando apresentadas em perspectivas diferentes. Muito embora, para qualquer designer, seja óbvio que se devem usar diferentes perspectivas para mostrar diferentes aspectos do projecto, essa discussão não é assim tão simples. Segundo Stephen Palmer, no seu livro Vision Science (pp.421-24) , em geral, as pessoas identificam mais rapidamente imagens dos objectos quando a câmara está posicionada entre 30-45 graus acima e 30-45 graus à esquerda/direita do objecto, do que quando o enquadramento é frontal. Esta visão em diagonal descendente parece ser a que mais informação dá sobre a percepção da profundidade.
Segundo William J. Mitchell, no seu livro The Reconfigured Eye (p. 139), 45 degrees to the left of the viewer and 45 degrees above the ground is the standard position of "architect's light."
Um aspecto essencial na percepção das formas é a sua relação com a orientação. Qualquer um de nós pode constatar, no seu quotidiano, que há alterações na qualidade da percepção da forma em função da sua orientação. Na realidade, as formas resistem mais facilmente a alterações de tamanho do que de orientação. Por vezes, apesar da nossa capacidade de imaginação visual, que nos permite fazer a rotação mental das formas, uma forma conhecida pode perder a sua identidade ao ser inclinada, invertida ou espelhada em relação à sua orientação habitual. Como seria expectável, a taxa de identificação bem sucedida das formas, em orientações diversas, está muito dependente da frequência com que estas são visualizadas nessa orientação. Por exemplo, a forma de uma chave ou de uma faca são facilmente reconhecidas em qualquer ângulo mas, o mesmo já não se verifica com a imagem de um cão, uma árvore ou um carro. Isto ocorre porque aprendemos a percepcionar essas formas segundo uma orientação específica, neste caso a posição perpendicular ao solo. Este fenómeno não se verifica apenas nas imagens bidimensionais mas, também, nas imagens que contêm informação tridimensional.
Graças à exposição repetida a determinadas orientações, nós formamos, na nossa memória, aquilo que é designado por uma perspectiva canónica ou estereotípica. Esta perspectiva será a melhor para descrever aquela forma, a que é mais fácil, mais rápida e que nos dá mais informação sobre o objecto representado. Normalmente, corresponderá àquela primeira imagem que surge na memória quando evocamos determinado objecto. Com ela conseguiremos economizar recursos cognitivos e ser mais eficientes na comunicação. Este fenómeno encontra explicações na teoria da Gestalt e na pesquisa sobre construção de protótipos. O trabalho experimental de Palmer, Rosch e Chase (1981) forneceu-nos dados que suportam o exposto sobre as perspectivas canónicas.
Nas aulas, quando discutimos esta temática, costumo realizar um pequeno exercício com os alunos e que consiste em pedir-lhes que desenhem uma chávena de café com pires. Os resultados nunca são inesperados. Quando comparados os desenhos, com as imagens que preparei previamente (ver imagem acima), a maioria deles corresponde àquela que consideramos ser a perspectiva canónica para esse referente (inserida no rectângulo amarelo)…
O estudo das perspectivas canónicas pode nos ajudar a compreender a percepção humana mas, também, a forma como processamos e como armazenamos a informação na nossa mente. Para o designer este é, obviamente, um assunto a considerar quando é preciso tomar decisões sobre que perspectivas, ou orientações, dar ás imagens.
Referências:
Palmer, S. E., Rosch, E., & Chase, P. (1981). Canonical perspective and the perception of objects. In J. Long & A. Baddeley (eds.), Attention and performance IX. Hillsdale, NJ: Erlbaum.
Mitchell, William J. (1992).The Reconfigured Eye: Visual Truth in the Post-Photographic Era. The MIT Press.
Palmer, Stephen E. (1999). Vision Science: Photons to Phenomenology. The MIT Press.
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